terça-feira, 2 de novembro de 2010

FotoTexto


            Outro dia, mostrei ao meu filho minha velha amiga, uma câmera fotográfica Yashica. Percebi que ele, que agora está com 6 anos, nunca tinha visto outro tipo de câmera que não as digitais. Pois bem, fui lá, peguei a “CHICA” e apresentei-a ao meu rebento com toda pompa e circunstância. Logo de primeira ele me indaga: “Mas mãe, onde vê a foto?” Ali, naquele momento, senti um aperto no coração. Mostrei um rolo de filme, abri a câmera, e disse como funcionava. Ele olhava aquilo como algo muito distante dele e com razão. Aí dessa vez, fez o contrário: perguntou-me onde se colocava o filme na câmera digital (ele não havia visto ainda os cartões de memória).

          Uma boa experiência... constatar ali, na prática, ao vivo e a cores, que já vivi, presenciei, tive coisas que hoje são obsoletas. E olhe que ainda não cheguei na casa dos quarenta anos de idade. O tempo passa, a tecnologia voa.

Foi então que recordei que um dia, bem antes desta era da foto digital, tentei ser fotógrafa. Comprei livros sobre o assunto, ganhei livros sobre o assunto. Adquiri máquina fotográfica com direito a lente zoom e tripé, de quebra. Passava horas admirando aquelas fotografias lindíssimas dos livros.

Fotômetro, diafragma, obturador, perspectiva, enquadramento eram palavras que passavam a fazer parte do meu incipiente universo fotográfico. Nunca tive muita vocação pra autodidata, então tratei logo de procurar um curso. Sim, um curso me tornaria a fotógrafa que sonhei ser.

“Agora sim, agora vai”, pensei. Afinal de contas, fazendo um curso, eu teria a disciplina necessária, horário, conteúdo organizado, exercícios práticos. Teria um mestre a desvendar-me os mistérios da luz, a revelar-me os truques daquelas imagens tão cheia de efeitos que via nos livros. Como captar a alma de uma pessoa em um retrato em preto e branco?  De que forma brinco com a luz tornando aquela foto de paisagem em uma verdadeira pintura? Como registrar a beleza de um animal em movimento? Como fazer um simples sorriso emocionar aqueles que o olham?

Mais que respostas a estas perguntas, buscava uma forma de expressão. Queria mostrar minha forma de ver o mundo. Queria expor à luz os meus sentimentos por meio daqueles cliques, gerando empatia entre o meu olhar e o dos outros. Queria cruzar os olhares. Observar pra ser observada depois, por meio daquela forma de registro tão mágica. Queria tornar a observação concreta, palpável, talvez até personificada ali naquele papel fotográfico. Não apenas os negativos seriam revelados, muitas outras coisas mais...

Diferente de hoje, quando temos a tecnologia digital e já antevemos o resultado das fotos por meio daquela telinha na câmera, tínhamos o escuro, a surpresa, a ansiedade por ver o resultado após o processo de revelação. Buscar aquele envelope recheado com as fotos era um evento. E que decepção quando algo dava errado: filme velado, fotos desfocadas, tremidas, mal enquadradas, com pouca luz ou superexpostas... tudo era possível. Por mais que se conhecesse as técnicas, ter domínio sobre elas não era da noite pro dia. Havia que se gastar muitos cliques e estragar rolos de filme para se chegar lá! Eu mesma me frustrei várias vezes.

            Mas voltando ao assunto do curso de fotografia. Ocorreu que, em algum momento daquele processo, descobri que me aborrecia com toda a teoria em torno da feitura de uma foto. O que antes era minha curiosidade, tornou-se “burocrático” demais.  O mestre do curso dizia: fazer uma boa foto não é questão de sorte. É técnica. E eu me perguntava: será mesmo? E a sensibilidade onde fica nesta história?

No fundo eu achava que fazer boas fotos era apenas uma questão de sensibilidade e um "olho bom" pra aquela atividade. Adorava apreciar belas fotos, e para isso a tal da sensibilidade não me faltava, graças a Deus. No entanto, eu não tinha aquele “olho” de fotógrafa, nem a paciência necessária para aplicar todo aquele cabedal de técnicas para obter este ou aquele resultado.

Continuei amante da fotografia, porém a paixão tornou-se platônica apenas. Já não quero mais desvendar seus mistérios, já não a quero como fixação. Nossa relação é mais aberta, eu a visito de quando em quando, mas só por diversão, não mais com aquela obrigação de conquistá-la, muito menos ainda querendo dominá-la. Continuo a apreciar sua beleza e me encanto com as imagens feitas por quem tem apenas o tal olho bom ou que  também sabe utilizar as técnicas.

Mas não pense que desisti da fotografia. Descobri que podia fazer meus retratos de outra forma: passei a fotografar com as palavras... ;D


2 comentários:

  1. e qr jeito melhor de fotografar? nao existe! saber que cada leitor terá uma visao diferente da fotografia que vc qr passar eh magnífico!
    x)

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  2. Texto lindo!
    Seu professor de fotografia pode saber tecnicas e mais tecnicas de fotografia, mas sem a sensibilidade, sem o momento, enfim, sem o acaso, serao fotos bem tiradas e so. ;)
    Eu sou outro amante platonico da fotografia; adoro, mas nunca estudei, e sei que para se alcancar certos niveis gasta-se muito dinheiro... Entao me contento registrando momentos, esporadicamente, do jeito que da... ;)
    Zayra, keep the great work up!!!

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